Um ano após a entrada em vigor da chamada “Taxa das Blusinhas”, a política criada pelo governo federal para proteger o varejo e a indústria nacional mostrou poucos resultados efetivos sobre o emprego e o investimento produtivo.
A conclusão está num levantamento inédito feito pela LCA Consultores a pedido da Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec) ao qual o InfoMoney teve acesso, que indica que a medida acabou penalizando mesmo os consumidores de menor renda, sem impacto mensurável na geração de empregos.
Instituída pelo Artigo 32 da Lei 14.902/2024, a taxa fixou uma alíquota de 20% sobre compras de até US$ 50 feitas em plataformas internacionais de e-commerce, de roupas e eletrônicos a utensílios domésticos e produtos de beleza.
De acordo com o estudo, entre agosto de 2024 e agosto de 2025, o crescimento do emprego nos setores beneficiados pela taxação, como comércio varejista e indústria, ficou em apenas 0,97%, abaixo da média nacional de 3,04%. A análise dos dados do Ministério do Trabalho mostra que o desempenho do emprego formal nesses setores se manteve praticamente igual ao dos 12 meses anteriores à vigência da taxa.
Impacto concentrado
O levantamento também aponta que cerca de 70% de toda a arrecadação proveniente da taxa vem de consumidores das classes C, D e E, segundo pesquisa do Plano CDE usada pela LCA. Isso caracteriza um modelo regressivo de tributação, que pesa proporcionalmente mais sobre as famílias de menor renda.
Desde a criação da taxa, as importações mensais de bens de consumo caíram US$ 122 milhões em agosto de 2024 e US$ 176 milhões em junho de 2025, quando comparadas à tendência de crescimento interrompida pela medida.
Entre os consumidores de menor renda, a proporção dos que desistiram da compra após ver o preço final com imposto subiu de 35% para 45%, e 80% afirmaram buscar produtos que não encontram no mercado brasileiro. “Isso mostra que a política reduziu não só o poder de compra, mas também a diversidade de bens disponíveis”, aponta o estudo.
Brasil entre as maiores taxas
Com a mudança, o Brasil passou a ter uma das maiores cargas tributárias sobre importação de baixo valor da América Latina. Enquanto o país cobra 20% de imposto de importação e até 20% de ICMS, países como Argentina e Chile isentam pequenas remessas do imposto de importação, e Colômbia e Peru dispensam ambos os tributos.
“O modelo mais eficiente é o adotado por países que combinam isenção na importação de baixo valor com a cobrança isonômica do imposto de consumo”, explica o diretor de Regulação e Políticas Públicas da LCA Consultores, Eric Brasil.
Segundo o diretor, esse formato (recomendado por organismos como OMC e OCDE) reduz custos administrativos e favorece o consumidor. “A própria Reforma Tributária caminha nessa direção, ao propor um IVA unificado que trará maior equilíbrio. Até lá, o ICMS poderia exercer o papel de imposto sobre consumo, isentando pequenas remessas e alinhando o Brasil ao padrão internacional”, afirma.
Mercado de trabalho
Eric Brasil explica que a taxa não gerou o aumento de contratações esperado porque o mercado de trabalho formal no Brasil tem baixa sensibilidade a políticas pontuais como essa. “Custos de contratação e demissão, além da burocracia, dificultam qualquer resposta imediata das empresas”, disse.
Além disso, a economia já vinha em aquecimento, com queda no desemprego, o que torna o impacto marginal da taxa quase irrelevante, de acordo com o diretor. “E o consumo que deixa de ir para plataformas estrangeiras não se transforma necessariamente em demanda para a indústria local, já que muitos produtos não têm similares nacionais”, acrescenta.
Revisão da medida
O tema deve voltar ao debate no Congresso Nacional ainda neste semestre. Segundo André Porto, diretor executivo da Amobitec, o estudo da LCA deve contribuir para a discussão sobre o futuro da política.
“O e-commerce é um dos motores da economia digital, gerando empregos, inovação e arrecadação. Penalizar o setor com medidas restritivas é caminhar na contramão do desenvolvimento. É preciso construir políticas com base em dados e diálogo com os setores envolvidos”, afirma Porto.


