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Como domínio da China sobre terras raras ameaça fortalecimento militar da Europa

7 de novembro de 2025 |
05:40
Imagem: Pixabay

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Os governos europeus estão correndo para rearmar suas forças militares diante de uma Rússia mais agressiva e de uma América cada vez mais isolacionista. Mas esse esforço enfrenta um obstáculo formidável: as restrições impostas pela China sobre minerais críticos.

A China domina o mercado de metais de terras raras e ímãs permanentes — essenciais na produção de mísseis, jatos, drones e uma vasta gama de equipamentos militares. Pequim tem usado esse poder de barganha em suas guerras comerciais com Washington e Bruxelas, apertando ou afrouxando o controle sobre exportações de terras raras nas negociações sobre tarifas e outras barreiras comerciais.

Esse cenário desencadeou uma série de ações na Europa. Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, o braço executivo da União Europeia, disse que o bloco deveria “buscar sua independência” em relação aos minerais críticos.

Enquanto isso, autoridades comerciais europeias têm se engajado freneticamente com seus colegas chineses para tentar garantir o abastecimento do bloco.

Na quarta-feira, 5, embaixadores dos 27 países da UE foram informados de que a China parecia disposta a negociar as chamadas licenças gerais para agilizar as exportações de terras raras para a Europa.

Mas não havia garantia de que uma solução assim viria rapidamente — ou que duraria. O bloco está focado em encontrar fontes alternativas de suprimento, disseram dois diplomatas a par das discussões, sob condição de anonimato para tratar de deliberações internas.

No curto prazo, o objetivo das negociações é “dar mais segurança à indústria europeia”, disse Olof Gill, porta-voz da Comissão Europeia. “O diálogo continua.”

Ainda assim, os altos e baixos deixaram claro para os líderes europeus o quanto seu rearmamento depende de uma relação cada vez menos confiável com a China.

“Tudo depende disso”, afirmou Joris Teer, pesquisador do Instituto da União Europeia para Estudos de Segurança. Sem o fluxo de minerais críticos, “não há rearmamento.”

Após o anúncio das tarifas pelo ex-presidente Donald Trump em abril, Pequim respondeu rapidamente limitando a exportação de sete elementos de terras raras e ímãs para todo o mundo.

No mês passado, ameaçou ampliar essa lista, antes que Trump e Xi Jinping, o principal líder chinês, concordassem, em uma cúpula na semana passada, em adiar essa escalada por um ano.

Mas as restrições de abril continuam em vigor para os compradores europeus — e, apesar de todo o discurso da UE sobre diversificação, Pequim mantém Bruxelas em uma posição delicada.

Cerca de 98% das importações da UE de terras raras essenciais vêm da China, tornando o bloco ainda mais dependente do que os Estados Unidos, que importam cerca de 80% desses materiais do país asiático. Embora as terras raras existam em todo o mundo, sua extração e refino são processos extremamente complexos.

A União Europeia tem tentado reduzir essa dependência e aprovou, em 2024, uma lei para criar uma indústria doméstica de minerais críticos. Mesmo assim, substituir a capacidade chinesa de mineração e refino não é algo rápido nem simples.

Analistas da consultoria SFA Oxford estimaram recentemente que uma “diversificação completa” em relação à China levaria de 8 a 12 anos, considerando o tempo necessário para desenvolver minas, construir refinarias, expandir a produção e integrar tudo à cadeia de suprimentos da OTAN.

E, quando se trata da indústria de defesa, a Europa não dispõe desse tempo.

Os países europeus estão se apressando para aumentar os gastos militares e desenvolver capacidades-chave até 2030.

 

 

Para isso, a União Europeia afrouxou regras orçamentárias e lançou um programa de empréstimos de 150 bilhões de euros (R$ 926 bilhões) para impulsionar os investimentos em defesa.

A falta de acesso a minerais críticos pode atrapalhar essa iniciativa, alterar o equilíbrio geopolítico e moldar o futuro da Europa.

“A autonomia em defesa começa com a autonomia em materiais”, disse Daniel Fiott, chefe do programa de Defesa e Política Estatal da Universidade Livre de Bruxelas.

Desde outubro do ano passado, exportadores chineses de terras raras são obrigados a informar às autoridades detalhes sobre o uso das remessas nas cadeias de suprimentos ocidentais.

Essas regras deram à China uma visão detalhada dos tipos e quantidades de minerais que empresas ao redor do mundo necessitam. A decisão de abril de restringir o acesso provocou escassez e fez disparar os preços de metais como disprósio — usado na fabricação de ímãs resistentes ao calor.

Os minerais de terras raras são fundamentais em caças F-35, drones, submarinos, mísseis Tomahawk, sistemas de radar e outras tecnologias militares produzidas nos Estados Unidos ou na União Europeia — e que a Europa planeja estocar como parte de seus planos de rearmamento.

“O objetivo final da China é desacelerar o avanço dos Estados Unidos e da Europa de forma interligada”, afirmou Benedetta Girardi, analista do Centro de Estudos Estratégicos de Haia. “Se atinge o setor de segurança de um, atinge também o do outro.”

Maros Sefcovic, chefe de comércio da União Europeia, observou que, desde que Pequim passou a exigir licenças para exportação de terras raras, apenas cerca da metade dos 2.000 pedidos feitos por entidades europeias foram “devidamente processados.”

Mesmo que a China tenha recuado em sua mais recente ameaça de controles mais rígidos, o simples fato de ter cogitado restrições amplas já serve como alerta.

“Continuo preocupada”, disse Gracelin Baskaran, diretora do Programa de Segurança de Minerais Críticos do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. “Mesmo uma pausa nas restrições nos deixa em situação precária.”

Ela destacou que Europa, Estados Unidos e aliados ainda não estão em condições de substituir rapidamente o disprósio usado em motores de drones, por exemplo.

O mundo também não possui uma alternativa real ao fornecimento chinês de samário, um mineral essencial para ímãs que suportam altas temperaturas em equipamentos militares avançados.

Mesmo com os riscos da dominância chinesa ficando cada vez mais claros, a Europa tem dificuldade em transformar preocupação em ação.

Os Estados Unidos estão avançando rapidamente: o Departamento de Defesa comprou uma participação de US$ 400 milhões na empresa MP Materials, e nesta semana anunciou centenas de milhões de dólares em empréstimos e participações potenciais nas companhias Vulcan Elements e ReElement Technologies, que buscam produzir ímãs a partir de terras raras recicladas.

Na Europa, empresas do setor ainda duvidam se os incentivos do bloco — como compras conjuntas, acesso a financiamento e agilização de licenças — serão suficientes a tempo.

Por isso, a diplomacia parece ser a principal, e talvez única, esperança no curto prazo.

“Os chineses estão tentando puxar o tapete debaixo de toda a iniciativa de rearmamento da Europa”, disse Teer. “Não é algo que um oficial de defesa ou alguém da indústria queira dizer em voz alta.”

 

c.2025 The New York Times Company

Fonte: The New York Times