Em votação relâmpago na madrugada desta quinta-feira (17), a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2.159/2021, que cria o primeiro marco legal para o licenciamento ambiental no Brasil. O texto, que segue para sanção presidencial, é chamado por críticos de “PL da devastação”, em referência aos efeitos que pode ter sobre a proteção de biomas e o controle de atividades poluidoras.
Foram 267 votos favoráveis e 116 contrários. A proposta teve apoio massivo da bancada ruralista e de setores da indústria, que pressionavam pela aprovação em nome da “agilidade” e “segurança jurídica”. Mas organizações socioambientais, pesquisadores e o próprio Ministério do Meio Ambiente alertam: o projeto pode enfraquecer a principal ferramenta de controle ambiental do país.
O que muda na prática
O projeto substitui o atual emaranhado de regras federais, estaduais e municipais por uma nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Entre as mudanças, está a criação de modalidades simplificadas, como a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que dispensa análise prévia de técnicos em casos definidos por autoridades licenciadoras.
O texto também permite que as licenças sejam renovadas automaticamente via formulário online, se o empreendedor declarar que não houve mudanças no empreendimento — o que, para especialistas, reduz drasticamente o monitoramento público.
Além disso, o projeto prevê isenções para diversas atividades do agronegócio, como cultivo de espécies agrícolas, pecuária extensiva e intervenções em situações consideradas emergenciais. Empreendimentos militares e obras públicas de energia de até 69 quilovolts também passam a não exigir licenciamento.
Críticas
Para o Observatório do Clima, a LAC pode abrir caminho para tragédias como a de Brumadinho, onde uma barragem se rompeu matando 270 pessoas. A ONU também expressou “profunda preocupação” com a proposta, apontando que ela pode agravar a crise climática e comprometer compromissos assumidos pelo Brasil em acordos internacionais.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que o texto aprovado contém dispositivos inconstitucionais e pode fragilizar a fiscalização. Ela defende vetos presidenciais e correções no texto. Segundo Marina, o projeto rompe com o princípio da precaução, um dos pilares da política ambiental brasileira desde a Constituição de 1988.
“O que se está fazendo com esse projeto é retirar a capacidade do Estado de avaliar e mitigar impactos antes que eles ocorram. É colocar em risco populações, ecossistemas e a credibilidade do país”, afirmou a ministra em nota oficial.
O que dizem os defensores
A relatora do projeto no Senado, Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura e ligada ao setor rural, nega que haja autolicenciamento. Segundo ela, a LAC vale apenas para atividades de impacto conhecido e previsível, como galpões agrícolas ou pequenas reformas.
Já o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD), afirma que a nova lei “provocará o desenvolvimento do país” ao destravar obras paradas por entraves ambientais.
O Instituto Pensar Energia e o Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração) elogiaram o projeto. Para eles, o marco traz previsibilidade e reduz gargalos para projetos de infraestrutura, como hidrelétricas e linhas de transmissão.
Apesar da forte mobilização contrária — 350 entidades assinaram manifestos pedindo mudanças —, o texto segue praticamente intacto para a sanção do presidente Lula. Integrantes do governo admitem que vetos são avaliados, mas há pressão de parte da base aliada no Congresso para que o texto seja mantido.
Enquanto ambientalistas veem retrocesso, setores produtivos comemoram a “modernização” do licenciamento. O embate agora se concentra no Planalto: entre o desejo de aceno ao agro e a pressão por coerência ambiental, o governo terá que decidir até onde vai sua régua sobre o equilíbrio entre desenvolvimento e preservação
 
								 
															 
								 
								 
								 
								


